sábado, 13 de dezembro de 2014

Parasitoses intestinais: ainda se deve fazer a desparasitação por rotina? Não!

A elevada prevalência de «lombrigas» intestinais nas décadas de 80 e 90 do século XX em Portugal, justificava a recomendação para a desparasitação por rotina contra helmintas intestinais. A baixíssima prevalência atual e o potencial benefício da infestação crónica por poucos parasitas tornou obsoleta e supérflua essa prática.
Também a simultânea desparasitação com anti-helmintas, dos conviventes humanos (em casa e nos jardins de infância) e dos animais é uma medida errada, pois não tem justificação científica.

Coalescencia dos pequenos lábios na menina

O que é a coalescência dos pequenos lábios?

A palavra coalescência significa aderência entre duas partes que antes estavam separadas. A coalescência dos pequenos lábios (CPL) consiste na união adquirida entre os bordos inter- nos dos pequenos lábios da vulva, com formação de uma fina membrana mediana que obs- trui parcial ou completamente a abertura da vagina, mas sem cobrir nem a abertura da ure- tra (chama-se uretra ao canal por onde é eliminada a urina) nem o clítoris.

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Critérios de alerta na criança com febre (CAF)

Existem mais de 400 vírus capazes de provocar febre numa criança. Felizmente as crianças não apanham todos os vírus existentes. Nem sempre o facto de se contrair uma infecção resultará em febre. Por exemplo, na varicela, umas crianças desenvolvem febre enquanto outras não. Por estas razões algumas crianças saudáveis terão febre muitas vezes, sobretudo nos primeiros dois anos de vida e/ ou após o seu ingresso nos infantários, enquanto outras têm febre menos vezes.

domingo, 7 de dezembro de 2014

Convulsões febris

O que são convulsões febris?

São contrações musculares involuntárias repetidas e/ou sustentadas, associadas a perda transitória de conhecimento, acompanhadas por febre (temperatura ≥ 38oC determinada por qualquer método de avaliação), que ocorrem na ausência de doença neurológica subjacente ou outra causa definida de convulsão, no grupo etário entre os 6 meses e os 5 anos de idade.
As convulsões febris (CF) podem cursar com olhar fixo, revulsão ocular («revirar os olhos»), sialorreia («babar-se», «espumar-se»), cianose (cor roxa, sobretudo à volta da boca) ou perda do controlo dos esfíncteres (perda involuntária de fezes e/ou urina).

Doenças de evicção escolar e de infantarios - O que diz a Lei


Ema Grilo, XVII Reunião da SPA-SPP, Infeções e Infantários, 15 Novembro 2014

Doença Aguda na Escola


XXII Jornadas de Pediatria de Leiria e Caldas da Raínha, CONSENSOS SOBRE URGÊNCIAS PEDIÁTRICAS, Leiria, 27-28 de Novembro de 2014

sábado, 15 de novembro de 2014

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Quando se deve recorrer ao médico numa criança com febre?

O terceiro dia de febre é um mau dia para se ir ao médico


Quando se deve recorrer ao médico numa criança com febre?

Quando for preciso!
Não existe dia para uma consulta médica na criança com febre.
Existem sim sinais / sintomas que, associados à febre, justificam recorrer ou não ao um médico / hospital.
A presença de qualquer dos sinais abaixo indicados, independentemente do dia de febre, justificam consulta imediata ou urgente.


Justifica-se observação imediata:

Por cada 1.000 episódios de febre, num deve-se ir imediatamente ao hospital. Poderá estar em causa: meningite, sépsis, encefalites, pericardites endocardites. Não se deve perder tempo perante:
  • Choro / dores intensas ou comportamentos indicativos de dor forte em qualquer local do corpo, em especial se são despertadas por qualquer tipo de movimento ou pela manipulação; 
  • Recusa do colo com choro, preferindo o leito, após várias tentativas com algum tempo de intervalo;
  • Manchas vermelhas dispersas pelo no corpo, que surgem logo no primeiro dia de febre (mesmo que apareçam e desapareçam em minutos ou horas), numa criança que “não está bem”;
  • Manchas tipo picada de pulga (que não desparecem à pressão com um dedo); 
  • Palidez intensa de instalação em poucas horas, sobretudo se associada a sede intensa e/ou a gemido;
  • Sede intensa, não saciável (avidez pelos líquidos);
  • Choro débil, pouco audível ou pelo contrário, choro inconsolável para além de 2 a 3 horas seguidas e que persiste após analgésico. 
  • Gemido constante; 
  • Prostração mantida – isto é, se a criança “estando acordada, se comporta com se estivesse a dormir”, permanecendo alheia ou quase alheia à presença dos pais ou indiferente a estímulos habitualmente fortes para elas; 
  • Sonolência excessiva e prolongada para a situação;
  • Alteração do estado de consciência;
  • Pausas respiratórias prolongadas (superiores a 10 segundos), ficando o doente roxo;
  • Convulsão;
  • Recém-nascidos.


Justifica-se observação urgente (no próprio dia):

Cerca de 10% dos episódios de febre em idade pediátrica são devidos a infeções bacterianas e/ou a manifestações graves de doenças virusais, que vão necessitar de tratamento antibiótico e/ou de cuidados hospitalares. Deve ser observada por médico, em menos de 24 horas após o seu início, toda a criança com febre associada a qualquer um dos seguintes sinais e/ou sintomas:
  • Gemido expiratório, isto é, expiração interrompida, ouvindo-se um intermitente e mantido (horas): hhham … hhham … hhham; 
  • Respiração persistentemente acelerada (> 60 ciclos respiratórios por minuto) avaliada com a criança a dormir;
  • Olhar triste, mantendo as pálpebras persistentemente entreabertas ao fim de várias horas;
  • Diarreia profusa líquida associado a avidez pelos líquidos; 
  • Sede intensa, não saciável; 
  • Recusa mantida (muitas horas) na ingestão de bebidas, seja o leite e/ou outros líquidos;
  • Vómitos repetidos (mais de 4 em poucas horas), sobretudo se surgem fora das refeições e que não são induzidos pela tosse; 
  • Sono habitual muito perturbado: a criança está incapaz de adormecer ao fim de várias horas, não conseguindo fazer um sono repousante, com acordares muito frequentes. 
  • Dedos e/ou os lábios que ficaram roxos durante a fase de subida térmica (“acrocianose da subida da febre”);
  • Calafrios mantidos com duração superior a 5 minutos – o corpo “treme todo” (tremores generalizados sem perda de consciência), acompanhado de ereção dos pelos e com tiritar dos dentes; não se deve confundir com convulsão (que dá perda da consciência);
  • Febre axilar superior a 40ºC e/ou rectal superior a 41ºC em duas ou mais avaliações com intervalo superior a 4 horas;
  • Manchas vermelhas difusas que se iniciaram nos primeiros dois dias de febre, tipo queimadura do Sol, ásperas ao deslizar da mão, sobretudo no tronco, raiz dos membros e no períneo;
  • Urina turva e/ou com mau cheiro; 
  • Recusa ou impossibilidade na mobilização de um ou mais membros ou parte de um membro; 
  • Dificuldade na mobilização do pescoço;
  • Torcicolo;
  • Idade inferior a 3 meses. 


Pode protelar-se a observação por médico

Cerca de 90% dos episódios febris são quadros benignos e maioritariamente autolimitados. Estes cursam com um conjunto de sinais e sintomas cuja presença sugere benignidade. São exemplos: tosse incomodativa, aftas na boca, conjuntivite, manchas róseas que surgem para além do 3º dia de febre, etc.
Não obstante poderem incomodar a criança e/ou os pais, esses sinais (na ausência dos sinais de gravidade atrás referidos) são tranquilizadores pois são indicadores de infeções sem gravidade.

sábado, 16 de agosto de 2014

A vacina contra o Meningococo B

O Meningococo B é uma bactéria que pode provocar infeção grave (sépsis e ou meningite) em todas as idades, mas em especial nas crianças e nos adolescentes. É uma doença grave com uma taxa de mortalidade entre 5 a 10% e elevada taxa de sequelas nos sobreviventes. A vacinação em massa de crianças e adolescentes irá permitir uma redução drástica na incidência de uma das doenças infeciosas mais graves da atualidade.


Como se manifestam as infeções por meningococos?

Os doentes surgem com febre e mau estado geral (prostração, sonolência e palidez acentuadas, gemido, etc.), de evolução muito rápida. Será imperativo que estes doentes sejam observados e internados logo no 1º dia de doença, devendo iniciar tratamento específico o mais breve possível, sob risco de um desenlace fatal e/ou de ficarem com sequelas graves. Saiba mais sobre meningococos aqui.


A sequência das manifestações clínicas é muito rápida, logo nas primeiras 24 horas da doença



Como se pode evitar esta infeção?

Na prática não havia forma de a prevenir, exceto após o reconhecimento dum primeiro doente, pela medicação dos contactos próximos (íntimos) deste primeiro doente. Essa medicação preventiva só servirá para esse momento.
Apenas a vacinação específica será eficaz como prevenção em geral.


Que vacinas existem? E qual a sua eficácia?

Desde 2001 que existe vacina contra o Meningococo C, que já faz parte PNV (Programa Nacional de Vacinação), atualmente com a recomendação de uma única dose aos 12 meses.
Em Junho de 2014 foi comercializada em Portugal a vacina (única ainda) contra o Meningococo B (Bexsero) de administração exclusivamente intramuscular.


Qual a eficácia desta vacina?

A Neisseria meningitidis do grupo B tem mais de 8.000 variedades (“cepas”, serotipos) diferentes. O Bexsero confere imunidade para 73% a 87% dos meningococos B (os que mais vezes são responsáveis por infeções graves).


A vacina Bexsero pode ser administrada simultaneamente com outras vacinas?

Sim. Tratando-se de uma vacina “morta”, poderá ser administrada no mesmo dia de outras vacinas do PNV ou extra-PNV ou uns dias depois destas.
Tratando-se de uma vacina “morta”, não é preciso guardar-se o intervalo de um mês entre outras vacinas.


Quem deve ser vacinado e até que idades?

Devem ser vacinadas todas as crianças (mesmo os indivíduos com as defesas diminuídas) idealmente a partir dos 2 meses de idade, assim como todos os adolescentes e adultos muito jovens. Mas não existe idade limite para esta vacina.


Porquê os adolescentes?

O contágio desta doença exige contacto íntimo. Os beijos, os grupos, a partilha do cigarro, do copo, etc., etc., proporciona uma transmissão muito fácil neste grupo etário.


Quais os riscos da vacina Bexsero?

Trata-se de uma vacina muito segura, resultado de 20 anos de estudos. São reduzidos os efeitos secundários potenciais: eritema no local da injeção, febre (surge no dia da vacina e tem duração inferior a um dia em ≈50% dos caso) e irritabilidade. Muito mais raramente poderá ocorrer sonolência, choro intenso, convulsão, diarreia e vómitos.


Quantas doses são necessárias?

O meningococo B é uma bactéria muito mais complexa que o meningococo C. Daí exigir mais doses de vacina do que o C. Dependendo da idade, serão necessárias entre 2 a 4 doses (Tabela I).


Tabela I: Resumo da posologia (número de doses) - igual para todas as idades (0,5 ml).



Qual o preço da vacina Bexsero?

Rondará os 98 Euros por cada dose.


Onde deve ser conservada a Bexsero?

No frigorífico entre 2ºC a 8ºC – na prateleira acima da hortaliça. Não se deve retirar da embalagem.

A prevenção da infeção por Meningococo B: uma realidade atual

A Neisseria meningitidis ou meningococo B, é uma bactéria que pode provocar infeções graves (sépsis e/ou meningite) em todas as idades, mas em especial nas crianças e nos adolescentes.
Logo no primeiro dia de doença os doentes ficam gravemente doentes com febre, prostração, dores nos membros e manchas róseas que evoluem para petéquias e/ou púrpura.
As elevadas mortalidade e morbilidade e as potenciais sequelas definitivas, justificam a vacinação generalizada das crianças e adolescentes.


O que são meningococos?

São bactérias, denominadas cientificamente como Neisseria menigitidis, que provocam infeções muito graves (sépsis e/ou meningite), mais frequentemente em crianças e adolescentes (Figura 1, 2, 3 e 4).
Os contágios íntimos (os grupos, beijos, cigarros partilhados, etc.…) justificarão o segundo pico da incidência desta doença nos adolescentes (Figura 2).
As Neisseria meningitidis mais comuns são os do grupo A (mais em Africa) e as dos grupos B e C (Europa, Américas, …).
Há mais de 10 anos que as crianças são vacinadas, por rotina, contra o meningococo C. Só em Junho de 2014 se iniciou a comercialização da vacina contra o meningococo B.
Pela elevada mortalidade, a sépsis por Neisseria meningitidis (infeção generalizada do corpo) ainda é mais grave do que a meningite. É frequente a ocorrência destas duas formas da infeção em simultâneo.

Figura 1: Casuística de 218 casos de infeção por Neisseria meningitidis (todos com culturas positivas), tratadas no Hospital Pediátrico de Coimbra (de 1980 a 2012): 42% ocorreram no 1º ano de vida; 5% morreram.

Figura 2: Prevalência da meningococemia e a imunidade adquirida (por contactos inadvertidos) e por idades; nos primeiros meses de vida transmitidos pela mãe; adaptado de: Pollard AJ et al. Neisseria meningitidis. In: Long SS et al. Principles and Practice and Pediatric Infectious Diseases 3th ed, 2008: pg 735.

Figura 3: Recém-nascido de 13 dias com sépsis por Neisseria menigitidis do grupo B; inicialmente apenas grande irritabilidade e lesão única de púrpura num braço; foi imediatamente internado e iniciado tratamento específico; só várias horas depois teve febre (máxima axilar 38,3ºC). Veio a ter sequelas nas ancas (coxoartrose).

Figura 4: Adolescente de 12 anos com púrpura; primeira queixa: dor intensa no 1º dedo do pé direito; na evolução exigiu amputação do 1º dedo do pé direito. Foto à 8ª hora de febre.



Como é que se manifestam as infeções por meningococos?

Em regra as crianças surgem com febre (alta ou não, difícil de controlar ou não), prostração (muito mais “caído” em comparação com episódios já passados de febre), sonolência excessiva, dores no corpo (que se pode manifestar nas crianças mais jovens apenas com choro à manipulação) e manchas no corpo.

Prostração é, estando acordado, comportar-se no corpo e na alma, como se estivesse a dormir.


Figura 5: A sequência das manifestações clínicas é muito rápida, logo nas primeiras 24 horas da doença


Logo no primeiro dia de doença é comum surgirem “pintinhas” espalhadas pelo corpo, sobretudo nos membros inferiores. Inicialmente podem ser manchas rosadas (Figura 6) surgindo depois, ou em simultâneo, uma pinta negra no meio dessas lesões róseas (são as petéquias), que não desaparecem à pressão, por exemplo com um vidro (Figuras 7, 8 e 9).
Quando as manchas escuras são superiores a 5 a 10 mm, denominam-se “púrpura” (Figuras 3 e 4).

Figura 6: Exantema róseo da infeção meningocócica: as manchas róseas surgem geralmente no primeiro dia de febre (podem ser fugazes = transitórias), ou preceder as petéquias (Figuras 7, 8 e 9).

Figura 7: Menino, 13 meses; sépsis meningocócica com prostração, manchas róseas e petéquias (≈ picada de pulga) com início nas primeiras 12 horas de febre; febre máxima 38,7ºC; teve boa evolução.

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Figura 8: Rapaz, 6 anos no 2º episódio de meningococemia: manchas róseas (máculas) e petéquias (fotos à 19ª hora de febre); 1º episódio aos 3 anos de idade.

Figura 9: Menino 2,5 anos, com sépsis com raras petéquias (não desaparecem à pressão com vidro); foto realizada à 12ª hora de febre.



Em regra as crianças e os adolescentes recorrem ao médico nas primeiras horas de febre (logo no primeiro dia). Como estão já “muito doentes” – com acentuadas prostração e sonolência, palidez intensa, vómitos, etc. – imediatamente são internadas e iniciam logo o tratamento (…ou pelo menos deveriam...).


Será imperativo que estes doentes sejam observados, internados e iniciem tratamento antibiótico adequado endovenoso, logo no 1º dia de doença, sob risco dum desenlace fatal e/ou ficarem com sequelas graves.


Que complicações pode trazer a infeção por Meningococo B?

Entre 5% a 10% virão a morrer (Figura 1). Nos que sobrevivem, são frequentes as sequelas: surdez, atraso mental, amputações de membros, etc.


Mas de onde provém a infeção? Quem contagia?

Periodicamente os meningococos colonizam (temporariamente) a garganta das pessoas, adultos ou não: estão presentes nas gargantas sem causarem doença. É o estadio “portador assintomático”. Em regra esses adultos estão imunes e por isso não contraem doença. Mas contagiam os outros.
E os problemas surgem se esses outros não estão imunes (sobretudo crianças e/ou adolescentes) – Ver figura 2.
Na maioria das vezes, são os cuidadores dos doentes, mais vezes os familiares mais próximos (pais, avós, etc.) que estão a origem da infeção.



Site aconselhado: www.bexsero.com



Nota: As fotas as fotos foram por mim tiradas com intuitos formativos e com a autorização dos pais. São testemunhos da minha experiência na Unidade de Cuidados Intensivos do Hospital Pediátrico de Coimbra, desde 1988.

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

O terceiro dia de febre é um mau dia para se ir ao médico


Ao contrário do que se tantas vezes se ensina, o 3º dia de febre é um MAU dia para se ir ao médico:
  1. Para as DOENÇAS GRAVES é TARDE demais:
    1.   67% (2/3) são internadas nas primeiras 24 horas da doença
    2.   ≈ 80% são internadas nas primeiras 48 horas da doença
  2. Para as DOENÇAS BENIGNAS e AUTOLIMITADAS (são a larga maioria das doenças febris) é CEDO demais:
    1.   > 50% duram > 72 horas (> 3 dias)
    2.   ≈ 30% duram > 120 horas (> 5 dias)
    3.   ≈ 10% duram 7 ou mais dias.

quinta-feira, 8 de maio de 2014

As lombrigas intestinais dos cães e gatos e suas repercussões nas crianças, adolescentes e adultos

Os animais de companhia (cães e gatos) estão frequentemente parasitados com lombrigas (helmintas). As lombrigas intestinas destes animais não provocam infeções intestinais em humanos. Mas podem provocar doenças noutros órgãos – olhos, fígado, pele, etc.
O contacto com cães e gatos não tem qualquer risco de desencadearem infeções por lombrigas intestinais em humanos. E a medicação com os “desparasitantes” comuns, e nas doses padrão, só trata as lombrigas existentes no intestino.
Assim, justifica-se um reforço da desparasitação dos animais de companhia e não das pessoas.



Figura 1: Joanito – o nosso cão; Figura 2 : Exposição a animais de companhia


Que tipos de parasitas intestinais podem existir nas pessoas e nos animais de companhia?

Existem dois grandes grupos de parasitas: os Protozoários (são microscópicos, constituídos por uma única célula) e os helmintas (as lombrigas). Apenas abordaremos estas últimas.

A medicação padrão com os fármacos conhecidos como “desparasitantes” só trata as lombrigas, e não os protozoários.

Os diferentes tipos de lombrigas, variam, no tamanho, de poucos milímetros a 40 cm. Em regra são visíveis a olho nu. Na Tabela I estão discriminados as lombrigas que podem afetar as pessoas e/ou cães e gatos.


Tabela I: Lombrigas (helmintas) que podem existir em pessoas e/ou em cães e gatos


Humanos Cães Gatos Doenças em humanas
Enterobius vermicularis (oxiúros) Sim Não Não Afeta 10 a 20% das crianças
Áscaris lumbricoides (áscaris) Sim Não Não Atualmente raro (< 2% das crianças)
Trichuris trichiura (trichuris) Sim Não Não Não há relatos de casos em crianças há mais de 10 anos
Strongiloides stercoralis (estrongiloides) Sim Raro Não Não há relatos de casos em crianças há mais de 10 anos
Ancylostoma duodenale (ancilóstomo) Sim Não Não Não há relatos de casos em crianças há mais de 10 anos
Taenia saginata e Tania solium (ténias)Sim Não Não Não há relatos de casos em crianças há mais de 20 anos
Toxascaris leonina Não Sim Sim Não
Toxocara canis Sim* Sim Não Larva migrans cutânea, visceral e ocular. Infeta humanos após penetração pela pele; não provoca doença intestinal em humanos
Toxocara catis Sim Não Sim Larva migrans cutânea, visceral e ocular. Infeta humanos após penetração pela pele; não provoca doença intestinal em humanos.
Trichuris vulpis Não Sim Não Não
Ancylostoma caninum Raro Sim Não Não
Ancylostoma tubaeforme Não Não Sim Não
Ancylostoma braziliense Raro Sim Sim Larva migrans cutânea (Figura 3), visceral e ocular. Infeta humanos após penetração pela pele; não provoca doença intestinal em humanos
Ancylostoma ceylanicum Raro Sim Sim Não existe em Portugal
Uncinaria stenocephala Sim Sim Sim Apenas larva migrans cutânea

Aelurostrongylus abstrusus
Não Não Sim Não

Angiostrongylus vasorum
Não Sim Não Não

Capillaria aerophila
Muito raro Sim Não Não
Dipylidium caninum (ténia) Muito raro Sim Não Não


Figura 3: Larva migrans cutânea por Ancylostoma braziliense


Conclusões

As lombrigas dos animais de companhia são diferentes dos humanos.
As lombrigas intestinas dos animais não provocam lombrigas intestinais em humanos.
Justifica-se um reforço no tratamento das lombrigas intestinais nos animais e não nas pessoas.

Como tudo na vida e nas profissões … muitos não fazem o que deviam; mas outros tantos, não deviam, mas fazem.



“Dos principais deveres do médico é o de educar a população,
e não o de prescrever fármacos”.
Sir Williams Osler

terça-feira, 29 de abril de 2014

A gripe sazonal - 6ª parte: As vacinas e as medidas preventivas dos contágios

A vacinação é a medida mais eficaz na prevenção da gripe, mas tem indicações bem definidas.
As medidas comportamentais para a prevenção dos contágios, como a etiqueta da tosse e espirro, têm utilidades limitadas, mas estarão sempre indicadas.



Quais as medidas preventivas dos contágios?

A vacinação (Figuras 1 e 2) e as medidas comportamentais e de “etiqueta da tosse e do espirro” (Figura 3).
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Figura 1 e 2: Vacinação contra a gripe é a medida preventiva mais eficaz


Figura 3: “Etiqueta da tosse e espirros” e medidas comportamentais para a prevenção da gripe - embora recomendadas, são muito menos eficaz do que a vacina


Que vacinas existem contra a gripe?

Existem dois tipos de vacinas:
  1. Inativadas: com vírus mortos ou partículas dos vírus da gripe prevalentes na comunidade: H3N2, H1N1 e gripe B; de administração intramuscular; variam de ano para ano (ver 1º texto). 
  2. De vírus vivos atenuados: constituídas por vírus vivos de baixa virulência de H3N2, H1N1 e gripe B; de administração nasal; indicadas dos 3 aos 50 anos; têm maior eficácia maior que vacinas inativadas; não estão comercializadas em Portugal.


Quantas doses de vacina inativada são precisas anualmente?

A partir dos 9 anos de idade bastará uma dose de 0,5 ml.
Dos 6 meses aos 8 anos só na primeira vacinação são necessárias duas doses, administradas com intervalo de 1 mês. Dos 6 meses aos 3 anos podem-se administrar doses de 0,25 ml ou 0,5 ml; a partir dos 3 anos estão indicadas doses de 0,5 ml.


Porque é que as crianças com menos de 6 meses não devem ser vacinadas?

Pela menor eficácia da vacina e pela ausência de estudos que atestem a segurança da vacina neste grupo etário.


Em que período do ano deve ser administrada a vacina?

Antes do período habitual de epidemia, de Setembro a Dezembro. A vacina demora pelo menos 2 semanas a tornar-se eficaz. Nas crianças, na primeira vez que se faz a vacina, esta só é eficaz 2 semanas depois da 2ª dose.


Quais os efeitos indesejáveis da vacina?

Poderá provocar febre (geralmente baixa) nas primeiras 24 horas após a injeção e reações locais (dor e inchaço). Reações graves são excecionalmente raras.


Qual é eficácia da vacina?

Varia entre 60% a 90%, sendo menor nas crianças com menos de 2 anos de idade. Se os cientistas falharem na previsão das estirpes anuais, a eficácia será diminuta (Figura 4). Mas mesmo que não impeçam a gripe, as vacinas reduzem a gravidade e a taxa de complicações.


Figura 4: A previsão anual da vacina pode falhar


Quem deverá ser vacinado anualmente?

  1. Indivíduos dos “Grupos de Risco” (ver 4º texto), exceto crianças com menos de 6 meses de idade;
  2. A vacinação das grávidas com parto previsível na época epidémica, conferirá alguma proteção ao futuro lactente (Figura 6).
  3. Profissionais que tenham contacto íntimo com indivíduos dos “grupos de risco”:
    1. Profissionais de saúde
    2. Profissionais das instituições
  4. Familiares (crianças e adultos) de indivíduos dos “Grupos de Risco”


Figuras 5 e 6: A vacinação anual é a medida mais eficaz na prevenção da gripe


Quais são as contraindicações à vacina?

A alergia grave ao ovo ou a outros componentes da vacina. As reações apenas no local da injeção não são contraindicações.


Que medidas devem adotar os doentes com gripe para minimizar os contágios?

  1. Preferivelmente ficar em casa
  2. Se internados, deverão ficar isolados ou confinados a divisões com outros doentes com gripe, durante 5 a 7 dias (ou mais nas crianças)
  3. Evitar o contacto com outras pessoas
  4. Evitar locais com aglomerações de pessoas: urgências hospitalares, transportes públicos, etc.
  5. Realizar uma adequada “etiqueta da tosse e dos espirros”:
    1. Não tossir para as mãos
    2. Tapar o nariz e a boca com lenços (melhor de papel), depois rejeitados para recipientes fechados
    3. Alternativa: tossir para a região do cotovelo (manga da camisola ou pele)
  6. Lavar frequentemente as mãos: após os acessos de tosse / espirros; antes de tocar em objetos que possam ser partilhados, etc.
  7. Evitar manusear objetos de uso comum.
  8. Usar máscara em ambientes públicos; eventualmente também em casa.


Quais as medidas recomendadas para a população em geral para a minimização dos contágios?

  1. Evitar o contacto próximo com doentes
  2. Lavagem frequente das mãos após a manipulação de superfícies potencialmente contaminadas, após cumprimento; após chegar a casa, antes de manipular alimentos, etc. (Figura 7)
  3. Desinfeção ou lavagem frequente de objetos / superfícies de uso comum
  4. Substituição regular dos objetos potencialmente contaminados
  5. Uso de material descartável na limpeza dos objetos, superfícies e secreções.


Figura 7: A lavagem das mãos é das medidas mais importantes nos períodos de epidemia da gripe ou de outras infeções respiratórias


quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

A gripe sazonal - 5ª parte: Diagnóstico, tratamentos e os sinais de gravidade

O diagnóstico da gripe é baseado exclusivamente em dados clínicos, reservando-se os exames laboratoriais para os casos graves ou complicados.
A larga maioria doentes pouco ou nada beneficia em recorrerem aos serviços de urgência e/ou ao médico assistente, pois a gripe não tem tratamento específico.
Apenas se recomendam fármacos para alívio da febre e das dores. Os antibióticos só se justificam se surgirem complicações.



O diagnóstico de gripe:

Em regra o diagnóstico de “gripe” é baseado exclusivamente em dados clínicos (Quadro I).

Quadro I: Clínica típica da gripe em adultos (na criança – ver texto 3)
  • Febre > 39ºC
  • Calafrios (= arrepios, tremores generalizados com tiritar dos dentes)
  • Tosse perturbadora (inicialmente seca)
  • Dores de cabeça (cefaleias)
  • Dores garganta (faringite)
  • Dores musculares (mialgias)

Este quadro clínico durante uma epidemia reconhecida de gripe, terá uma probabilidade de 80% de ser efetivamente gripe (os restantes 20% dizem respeito a outros vírus respiratórios).

Nas crianças com gripe, os calafrios e as mialgias são muito menos frequentes do que nos adultos. Daí que a sua presença em crianças seja atípico, sugerindo antes uma complicação.

As análises laboratoriais inespecíficas não ajudam a distinguir a gripe dos diferentes vírus respiratórios.
O diagnóstico de certeza, reservado para situações excecionais, faz-se pela identificação do vírus da gripe nas secreções respiratórias (métodos rápidos) ou por doseamento de anticorpos no sangue (métodos morosos).

Qual é o tratamento da gripe?

A gripe não tem tratamento específico: apenas estão indicados analgésicos/antipiréticos - paracetamol, ibuprofeno - para alívio da febre e das dores. Nas crianças deve evitar-se a aspirina (ácido acetilsalicílico) e os seus derivados pelo risco de poderem desenvolver síndrome de Reye.
São de utilidade controversa os fármacos para a tosse, estando contraindicados os antitússicos antes dos 2 anos de idade.

Existem gripes “mal tratadas” ou “mal curadas”?

Não. Estas expressões de uso comum são incorretas. As gripes não se tratam: evoluem espontaneamente.

Mas não existem tratamentos antigripais específicos?

Sim, existem 4 fármacos - oseltamivir, zanamivir, amantadina e rimantadina - que estão indicados apenas nas gripes sazonais graves e nas gripes pandémicas.
Não são antibióticos. Apenas reduzem a gravidade e a duração da gripe, e somente quando iniciados nas primeiras 48 horas de doença. E não evitam a maioria das complicações. Mesmo nos indivíduos pertencentes aos “Grupos de Risco”, raramente estão indicados.

E os antibióticos?

Nos surtos de gripe assiste-se ao aumento de 10% a 30% na prescrição de antibióticos, maioritariamente de forma inapropriada.
Os antibióticos não têm qualquer utilidade nas infeções provocadas por vírus, nem previnem as complicações bacterianas referidas no 4º texto. Mas justificar-se-ão antibióticos se estas, entretanto, ocorrerem.

Que “Sinais de Alerta” clínicos devem sugerir a probabilidade de complicações no decurso da gripe?

No Quadro III estão descriminadas as manifestações clínicas que devem sugerir potencial complicação da gripe e da necessidade de observação médica urgente.


Quadro III: “Sinais de Alerta” que justificam consulta urgente no decurso da gripe (e doutra infeção respiratória semelhante à gripe)

  • Febre (ver Figura 1):
    • Superior a 40ºC axilar (> 41ºC auricular ou rectal)
    • Duração superior a 5 a 6 dias sem melhoria
    • Ressurge após 1 a 2 dias sem febre
    • Agravamento da febre quando parecia que ia melhorar
    • Em idade pediátrica, também quando:
      • associada a calafrios prolongados e/ou
      • ficar com os lábios e/ou os dedos roxos.
  • Presença de sinais de dificuldade respiratória: aumento da frequência respiratória (Tabela I), “canseira” a respirar, esforço ou “opressão” para respirar, “falta de ar”, gemido frequente com respiração entrecortada com…hhhann…hhhann …hhhann…, tiragem (retração da pele entre as costelas) (Figura 2).
  • Prostração – “é, estando acordado, comportar-se na alma e no corpo como se estivesse a dormir”
  • Alteração do estado de consciência (sonolência excessiva)
  • Convulsões
  • Vómitos repetidos (> 4-5 em poucas horas, fora das refeições)
  • Frequência cardíaca aumentada ou arritmias
  • Canseira excessiva
  • Dor torácica ou abdominal persistente
  • Dor muscular intensa para pequenos esforços (por miosite aguda, que é muito dolorosa)
  • Incapacidade para comer e/ ou recusa completa dos alimentos (em > 2 refeições)

Figura 1: Características da febre que devem sugerir infeção bacteriana secundária e outros sinais sugestivos de complicação no decurso da gripe.

Figura 2: Tiragem entre as costelas (retração - seta) que é sempre sinal de esforço respiratório


O que é a frequência respiratória (FR) e qual o seu interesse?

A FR é o número de ciclos respiratórios (a inspiração mais a expiração) num minuto. Determina-se pelo número de inspirações durante um minuto (contar durante 15 segundos e multiplicar por 4). Deve ser avaliada numa fase sem febre ou com febre baixa e, preferivelmente, com o doente a dormir.
Na criança, a FR é um excelente indicador da presença ou não de complicações respiratórias: FR aumentada, podem existir; FR normal, será improvável.



Tabela I: Frequência respiratória (nº de inspirações por minuto) normal e na doença respiratória (a dormir)

Idades
“Normal”
Duvidosa
Aumentada
< 12 meses
< 40
40-60
> 60
1-3 anos
< 30
30-45
> 45
3 - 8 anos
< 25
25-35
> 35


Nas crianças:
O aumento da frequência respiratória é sempre o primeiro sinal de dificuldade respiratória.
Uma frequência respiratória normal torna muito improvável existir uma complicação pulmonar ou das vias aéreas.


Nas epidemias da gripe, é comum serem emanadas recomendações da Direção Geral de Saúde (DGS) desaconselhando os doentes de recorrerem aos serviços urgência. Porquê?

Uma vez que a gripe não complicada não tem tratamento específico, nem precisa de exames complementares nem de antibióticos, a larga maioria dos doentes pouco ou nada beneficia em recorrer aos serviços de saúde.
Muitos serão medicados desnecessariamente com antibióticos. Por outro lado, na mesma altura circulam na população vários tipos de infeções respiratórias. Assim, arriscam-se a contraírem aí uma segunda e uma terceira infeção num curto espaço de tempo.


Próximo texto: Gripe sazonal – 6ª parte: As vacinas e as medidas preventivas dos contágios.


segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

A gripe sazonal - 4ª parte: Potenciais complicações e os “Grupos de Risco”

Geralmente a gripe é uma doença relativamente benigna. Contudo, não são raras as suas complicações, algumas podendo colocar a vida em risco. Estas podem ocorrer em qualquer indivíduo, sendo mais comuns nos indivíduos dos “Grupos de Risco”.
O conhecimento das potenciais complicações e dos “Grupos de Risco” são importantes para a adoção das medidas preventivas e de vigilância.



A gripe é perigosa?

Não para a larga maioria das pessoas. Nalgumas, a gripe poderá cursar com complicações de gravidade variável.

  • A gripe e as suas complicações são responsáveis por ≈ 20% das hospitalizações nos meses de inverno, maioritariamente com pneumonias bacterianas.
  • O risco de morte pela gripe, em si e/ou pelas suas complicações, ronda os 4 por 100.000 casos.


Quais são as potenciais complicações da gripe?

São variadas as potenciais complicações da gripe. As mais frequentes estão descriminadas no Quadro I e na Figura 1, várias exigindo hospitalização.

Quadro I: Potenciais complicações da própria gripe (primárias) ou secundárias
  • Pneumonia primária da gripe
  • Infeções bacterianas secundárias:
    • Pneumonia secundária – por Streptococcus pneumoniae, ou Staphylococcus aureus, etc.
    • Laringotraqueobronquite / traqueíte bacteriana
    • Otite média aguda
    • Sinusite aguda
  • Desencadear crises graves de asma
  • Encefalite / encefalopatia
  • Miocardite e/ou pericardite
  • Miosite aguda = inflamação aguda dos músculos
  • Convulsão febril
  • Morte súbita inexplicável

Figura 1 - Potenciais complicações da gripe

Como é que a gripe pode levar à morte?

À exceção da otite média aguda, da sinusite aguda, da miosite aguda e da convulsão febril, todas as restantes complicações descritas no Quadro I poderão complicar-se de morte, pelas razões explicadas no Quadro II.

Quadro II: Mecanismos patológicos que podem levar à morte no decurso da gripe
  1. Insuficiência respiratória grave com dispneia (falta de ar): pneumonias, traqueíte, laringotraqueobronquite, asma grave. 
  2. Coma (encefalite); 
  3. Insuficiência cardíaca ou alteração do ritmo cardíaco. 
  4. Morte súbita idiopática

Muitas das mortes que ocorrem no decurso da gripe ficam sem explicação: são as mortes súbitas idiopáticas.
Felizmente, a morte é rara no decurso da gripe, exceto nos idosos muito debilitados e/ou em indivíduos com doenças crónicas debilitantes.


Essas complicações só surgem nos “Grupos de Risco”?

Não. São frequentes nos “Grupos de Risco”, mas também ocorrem em indivíduos não considerados de risco.

Quais são os indivíduos considerados “Grupos de Risco”?

No Quadro II são descriminados os indivíduos que têm risco acrescido de sofrer complicações no decorrer da gripe. Estes indivíduos justificam medidas preventivas reforçadas e uma maior vigilância clínica (Figuras 2 a 5).

Figura 2 e 3: Os idosos, as crianças com menos de 6 meses de idade e as grávidas, pertencem aos  “Grupos de Risco” de desenvolverem complicações no decurso da gripe.


Figuras 4 e 5: Os asmáticos e os obesos mórbidos também estão incluídos nos “Grupos de Risco”



Quadro III: “Grupos de Risco” – indivíduos com maior probabilidade de sofrerem complicações no decurso da gripe
  • Idade > 65 anos
  • Indivíduos residentes em instituições
  • Indivíduos sob internamento prolongado na época da gripe
  • Grávidas
  • Portadores de doenças crónicas:
    • Cardiovasculares – com compromisso da função cardíaca;
    • Défices de imunidade – SIDA, imunodeficiências primárias, imunossupressão medicamentosa, Endócrinas – diabetes mellitus, etc. Hematológicas – drepanocitose, outras hemoglobinopatias, etc.
    • Neurológicas – sobretudo se compromisso neuromuscular;
    • Obesidade mórbida (“doentia”, excessiva)
    • Pulmonares – asma brônquica, fibrose quística, doença pulmonar crónica, etc.
    • Renais – síndroma nefrótico, insuficiência renal crónica, etc.
    • Reumatológicas – lúpus eritematoso sistémico, dermatomiosite, esclerodermia, etc., em especial os doentes medicados com fármacos que diminuem as defesas (imunossupressores)
  • Doentes transplantados
  • Outras doenças crónicas debilitantes, em especial sob terapêuticas prolongadas com fármacos que diminuem as defesas naturais (imunossupressores).
  • Medicação prolongada com ácido acetilsalicílico (aspirina) ou derivados, em doses anti-inflamatórias – por exemplo na febre reumática.
  • Crianças com idade inferior a 6 meses*.
* As crianças com menos de 2 anos têm uma maior taxa de complicações comparativamente à população em geral. Mas tradicionalmente não são incluídos nos “grupos de risco”.

Se os indivíduos dos “Grupos de Risco” contraírem gripe, devem procurar assistência médica?

Sim, mas a orientação vai depender da gravidade e duração das manifestações clínicas.

Qual o prognóstico a longo prazo da gripe?

Em regra é excelente. É variável nos casos complicados de pneumonia, encefalite ou miocardite, decorrente de terem ficado ou não complicações definitivas (sequelas).


Próximo texto: Gripe sazonal – 5ª parte: Diagnóstico, tratamentos e sinais de gravidade.


sábado, 18 de janeiro de 2014

A gripe sazonal - 3ª parte: Manifestações clínicas e sua duração

Dominam a clínica da gripe: tosse seca, obstrução nasal, dores de garganta, cefaleias, dores musculares e a febre com calafrios. Nas crianças mais jovens são comuns os vómitos e a diarreia.
A febre dura até 5 dias, podendo prolongar-se mais de 7 em especial nos casos com febre a dois tempos (intervalo livre de 1 a 2 dias).
A tosse geralmente prolonga-se para além das 3 semanas.



Toda a gente exposta aos vírus da gripe adoece?

Não. Os que já tiveram contactos com os vírus da gripe semelhantes (ou foram adequadamente vacinados) adquiriram imunidade total ou parcial, estes manifestando apenas sinais de constipação e tosse ligeira com ou sem febre.

Quanto tempo decorre entre o contágio e o início dos sintomas da gripe?

Esse período denomina-se período de incubação, que no caso do vírus da gripe, dura em média 2 dias, com extremos de 1 a 4 dias (figura 1).
O período de incubação é variável de vírus para vírus, sendo muito curto na gripe.


Como é que os vírus invadem o organismo?

A gripe é essencialmente uma infeção das células das mucosas do aparelho respiratório. Ao atingirem a boca, o nariz, as conjuntivas ou os brônquios, o vírus influenza penetra e multiplica-se (replica-se) nas mucosas, onde provocam a destruição (necrose) das respetivas células, que coincide com o início dos sintomas.
Muitos vírus atingem a corrente sanguínea, provocando manifestações clínicas não respiratórias (figura 2).


Quais os sinais e sintomas mais comuns na gripe?

A gripe manifesta-se subitamente com febre elevada (geralmente > 39ºC axilar), calafrios (tremores generalizados), mal-estar geral, fadiga, perda de apetite, tosse, dores de garganta (associado a vermelhidão da faringe), dores de cabeça, dores musculares (mialgias).
A tosse é seca, frequente e incomodativa nos primeiros dias da doença, surgindo depois a expectoração.
Nas crianças é comum ocorrer também “tosse de cão” (tosse rouca ou cruposa), conjuntivite, dores abdominais, vómitos e a diarreia e, por vezes, convulsões febris (figura 3).


Quais são as manifestações menos comuns na gripe?

Excecionalmente podem ocorrer sintomas próprios do envolvimento do coração (com arritmias, etc. por miocardite) e do cérebro (diminuição da consciência, convulsões) por encefalite.
Nalgumas crianças surgem manchas vermelhas no corpo (exantema) que se iniciam depois do 3º dia de febre. Outras, já na fase de recuperação da gripe, surgem com dores musculares muito intensas que as impedem de caminhar (por miosite aguda), que duram 3 a 5 dias (mais pelo vírus influenza do tipo B).


Como se distingue clinicamente a gripe dos vulgares “resfriados”

Os “resfriados”, designados pelos médicos como rinofaringites ou “catarros respiratórios superiores, são provocados pelos vírus sincicial respiratório (VSR), rinovírus, vírus parainfluenza e adenovírus.
Estes vírus também causam epidemias ─ envolvendo crianças, adolescente e adultos ─ com clínicas muito semelhantes à da gripe (ver 1º texto).
Embora clinicamente seja frequente serem indistinguíveis, algumas diferenças clínicas poderão ajudar a diferenciá-las (Tabela I).

Tabela I: Diferenças clínicas entre a gripe e os “resfriados”
Clínica
Gripe
Rinofaringite
Início
Súbito
Gradual / Insidioso
Febre elevada (> 39ºC)
++++
++ / + / -
Coriza (“constipação”)
++
++++
Tosse
++++
++
Dores cabeça (cefaleias)
++++
++ / +
Dores de garganta
++
+++
Faringe vermelha
++
++
Dores musculares (mialgias)
+++
+ / -
Cansaço muscular
+++
+ / -
- pode faltar; + - por vezes; ++ frequente; +++ muito frequente; ++++ característico


Quanto tempo dura a febre na gripe não complicada?

A febre tem uma duração variável, sendo comum durar 5 a 7 dias. Mas pode ter uma evolução a dois tempos: febre durante 3 a 5 dias; apirexia 1 a 2 dias; febre novamente durante mais 2 a 3 dias. Daí que seja frequente a febre durar mais de 7 dias.
Contudo, esta evolução a dois tempos deve contudo sugerir a eventualidade duma complicação, sobretudo a pneumonia bacteriana, mas também a otite média aguda e a sinusite


Quantos semanas dura a tosse na gripe?

Nos primeiros 4 a 7 dias de doença, a tosse é seca e irritativa, tornando-se depois produtiva (com secreções) durante mais 1 a 2 semanas.
Na gripe, a recuperação completa da mucosa respiratória demora 15 ou mais dias após o início da infeção.
Isto justifica que mais de 10% das crianças terão tosse para além de 4 semanas. Mas a tosse intensificar-se-á e/ou prolongar-se-á ainda mais se, entretanto, a criança contrair uma nova infeção virusal respiratória (“um novo resfriado”, “mais uma virose”), como tantas vezes acontece nas creches, nos jardins de infância e nas escolas.


Próximo texto: Gripe sazonal – 4ª parte: Potenciais complicações da gripe e os grupos de risco